Em 1942, a família Pedroso aportou em Goiânia. Mas ao contrário da maioria dos imigrantes que chegava a nova cidade à época, seu Juvenal José Pedroso, a esposa, Jovita Cândido Pedroso e mais 11 filhos se estabeleceram na zona rural. A Fazenda Retiro, uma grande propriedade de 200 alqueires foi o destino do clã. A fazenda, situada no lado leste de Goiânia, ainda na zona rural, ficava a mais de uma légua de distância da cidade. Sem estradas e com pontes precaríssimas, chegar à capital era quase uma aventura.
Doze anos depois da chegada à fazenda Retiro, talvez num lampejo de visão de futuro, já que a região ainda era totalmente ocupada por propriedades rurais, seu Juvenal resolveu lotear parte da fazenda. 15 alqueires da Fazenda Retiro viraram 1177 lotes da Vila Pedroso. As quadras e os lotes foram demarcados, as ruas abertas, mas morador que era bom, nada. O filho de Seu Juvenal, seu Arcino José Pedroso conta que a procura pelos lotes era muito pequena e para conseguir fechar negócio, o pai recebia como entrada, qualquer objeto que o comprador oferecesse, como um relógio de pulso, que ele mesmo usou até bem pouco tempo.
E a falta de interesse dos compradores tinha uma explicação simples: o bairro era uma ilha perdida no mio da zona rural, distante cerca 10 quilômetros do centro da cidade. O último bairro, que também ainda era pouco habitado era o Jardim Novo Mundo, que mesmo assim ainda era muito longe. E o acesso era ainda pior, já que o bairro ficava depois de uma barreira de difícil transposição: o Rio Meia Ponte. Seu Arcino mesmo se lembra que as pontes que existiam, eram poucas e precaríssimas.
E a vida de quem se arriscava a ir morar na Vila Pedroso não era nada fácil. As ruas que foram abertas, aos poucos foram sendo tomadas pelo mato e trânsito de pessoas pelo setor era feito em “trieiros” no meio do matagal. O transporte coletivo só ia até o Jardim Novo Mundo e o resto do trajeto tinha que ser feito a pé, de dia ou à noite, fizesse sol ou chuva. E por conta dessa distância que os moradores tinham que percorrer para conseguir embarcar no transporte coletivo, a família de um dos moradores mais antigos da Vila Pedroso, Seu Geraldo Rocha Oliveira Filho, viveu uma tragédia: com o filho acometido de sarampo nos braços, a cunhada de seu Geraldo, saiu de casa em busca de socorro médico. No caminho para o Jardim Novo Mundo, onde embarcariam o transporte coletivo, mãe e filho foram surpreendidos por uma forte chuva, o que a fez a doença se complicar e a criança acabou morrendo dias depois.
E essa situação não foi passageira. Por muitos e muitos anos, a Vila Pedroso foi quase uma vila fantasma, que contava com pouquíssimos moradores. E como não havia quase ninguém habitando, o poder público também não se preocupava em levar benefícios ao bairro. Para chegar ou sair do bairro só a pé de bicicleta. Mesmo um ou outro morador que tinha carro enfrentava uma dificuldade imensa ao para se deslocar pelo bairro, já que além do matagal, os buracos eram outro entrave para circulação dos veículos.
O tempo passava, a cidade crescia para praticamente todos os lados. Bairros e mais bairros surgiam em uma Goiânia que já não parecia mais em nada àquela cidadezinha de interior das primeiras décadas. Ao contrário, a capital de Pedro Ludovico já tinha formas de uma metrópole apressada e moderna, mas a Vila Pedroso ainda permanecia esquecida e desabitada no extremo leste da cidade. O atual presidente da Associação de Moradores da Vila Pedroso, Alceu de Souza Góis, se mudou para o bairro já em 1986, 32 anos depois do início, mas ainda naquela época a vila reunia poucos moradores e continuava isolada em meio a propriedades rurais.
Depois de muitos anos de caminhada para embarcar no ônibus no jardim Novo Mundo, a antiga Viação Jussara, colocou uma linha para servir à Vila Pedroso, mas se engana quem pensa que os problemas de transporte coletivo dos moradores terminaram. Os ônibus passavam apenas 3 vezes ao dia e só circulavam superlotados e por causa dos buracos, viviam quebrando.
O presidente da Associação de Moradores se lembra ainda que durante muito tempo o bairro foi um local violento. Crimes de diversas naturezas eram comuns por aqui e os homicídios eram quase que diários. Por conta de todos esses problemas, os moradores tinham vergonha de contar onde moravam. Segundo Alceu, por muitas vezes, ao ser perguntado onde morava, ele respondia que era no jardim Novo Mundo ou outro bairro da cidade. A distância, a precariedade e o preconceito do resto da cidade acabavam criando outros transtornos para os moradores, como o desemprego. O presidente da Associação se recorda que as empresas não gostavam de contratar os moradores da Vila Pedroso, porque eles sempre chegavam atrasados.
A situação era tão precária ainda na segunda metade dos anos 80 que os meios de transporte mais comuns no bairro continuavam sendo a bicicleta e as carroças dos vizinhos chacareiros, que serviam, inclusive de ambulância no bairro.
Com tanta precariedade, o jeito era pressionar para conseguir os benefícios. E assim os moradores se uniram e foram à luta. A Associação dos Moradores reunia a população, que participava das manifestações, até que foram conseguindo os benefícios, primeiro, a água, depois o asfalto e assim, sucessivamente.
E a partir da chegada dos serviços básicos, o bairro foi melhorando e outros moradores foram chegando. Pressão daqui, pressão dali, a Vila Pedroso foi ficando cada dia melhor. E as propriedades rurais foram sendo loteadas uma a uma, até que quase tudo também virou cidade. Hoje, já são mais de 30 bairros na região leste, na parte conhecida como pós Meia-Ponte.
E depois de tanto sofrimento, nada mais justo que os moradores tivessem um bairro digno de sua população. Hoje, a opinião é unânime: falta pouca coisa por aqui. Mas nada que os faça pensar em trocar a Vila Pedroso por outro lugar. A vergonha que eles sentiam anos atrás deu lugar ao orgulho de se dizerem moradores da Vila Pedroso.
E como nos primeiros tempos em que ajudava o topógrafo a demarcar os lotes, Seu Arcino até hoje, 58 anos depois, trabalha pelo bairro. Com a morte dos pais, ele ficou responsável pela escrituração dos lotes. Alguns irmãos ainda moram por ali, outros mudaram. A irmã Nazaré Pedroso também loteou a parte dela na fazenda, criando o loteamento Grande Retiro. E na mesma casinha construída pelo pai, seu Arcino passa os dias, dando aos moradores que ainda não tem o documento, a garantia do seu imóvel.